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EXPOSIÇÃO DE ERNESTO NETO CHEGA AO ESPAÇO ESTÁDIO DA OFICINA FRANCISCO BRENNAND

Com “CapiDançaBaribéNois”, artista carioca ergue uma escultura de grandes proporções




No 11 de novembro de 2023, Foi aberta a exposição “CapiDançaBaribéNois”, de Ernesto Neto, na Oficina Francisco Brennand. O artista carioca, um dos mais relevantes nomes da arte contemporânea brasileira, instalou uma escultura inédita comissionada pela Oficina. Feita em crochê e com quase 50 metros de comprimento, a obra ficará suspensa no galpão do Estádio, que reabre para abrigar exposições após quase 20 anos funcionando como espaço multiuso.


Com curadoria de Clarissa Diniz e participações de nomes da arte, música, poesia e dança de Pernambuco, a exposição de Ernesto Neto marca o retorno do artista à capital pernambucana após duas décadas – a última vez que expôs na cidade foi em 2003, no Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães (Mamam).

“É muito simbólico para a Oficina ocupar o grandioso espaço do Estádio com uma obra igualmente grandiosa de Ernesto Neto, um dos maiores artistas do país. A escala de algumas de suas criações e a sua permanente inquietação e experimentação, bem como o uso de algumas formas e materiais, dialogam com a produção artística de Francisco Brennand. Estamos muito felizes que a chegada desse novo momento da instituição seja celebrada com uma obra de Neto”, comemora Marcos Baptista, presidente da Oficina.

“CapiDançaBaribéNois” tem patrocínio do Instituto Cultural Vale e da Vivix.


O rito de Ernesto Neto – do Marco Zero à Oficina Francisco Brennand pelo Rio Capibaribe


A relação de Ernesto Neto com a Oficina Francisco Brennand se estreitou em 2020, a partir de um convite da instituição para uma individual do artista no museu. Foi quando fez uma visita à cidade e, num passeio noturno pelo Rio Capibaribe, nasceu o sonho de fazer um cortejo fluvial até a Oficina. Esse sonho se realiza agora, em novembro de 2023, com o projeto “CapiDançaBaribéNois”, que, em sua natureza processual, ambiental e coletiva, envolve três momentos de materialização: rito de travessia (9.11), rito de montagem (10.11) e rito de abertura (11.11).

As visitas e a convivência com a cidade, a Oficina, o rio e a obra de Brennand inspiraram Ernesto a criar uma grande escultura. O trabalho consiste numa instalação tubular e serpenteante de crochê feito em chita e voile, com 47 metros de comprimento e suspensa a 8 metros de altura, cujos contrapesos serão peças em cerâmica, com especiarias, que homenageiam as casas de João de Barro, a força da vida e da natureza e a própria matéria-prima que anima a obra de Brennand e tantos artistas.


“Cada célula de crochê representa uma unidade, um ser, um indivíduo em espiral nesta grande floresta cósmica que é a vida, dentro de nosso corpo, na natureza e na sociedade.


Temos a cultura popular como base de todo este pensamento, a festa, o rito como grande acontecimento simbólico comum. Não é a toa que tudo isso está acontecendo às margens do capibaribe, na cidade do Recife”, celebra Ernesto Neto, que também homenageia a força festiva e ancestral do Nordeste em todas as partes desse trabalho.


À escultura do artista, foram incorporadas ainda seis alfaias, quatro caixas e um gonguê (“aquele agogô de uma boca só”). O interior da escultura foi preenchido numa montagem ritualística, no dia anterior à inauguração (10.11), com 170 quilos de folhas secas. “Elas dão uma ‘pressãozinha’ suave para a escultura ficar esticadinha”, explica o artista, que também chegou a fazer, em 2022, uma obra comissionada pelo Qatar Museums, dentro do contexto da Copa do Mundo, uma grande esfera terrestre na olaria da Oficina (parte da obra “Slug turtle, TemplEarth”).

“Eu adoro o trabalho do Brennand. Tudo que estou fazendo na Oficina é também uma homenagem ao velho Francisco”, comenta o carioca. Uma peça que inspirou diretamente a criação do seu “bicho ondulado”, como forma de dialogar com a extensão do Estádio, foi o “Peixe-folha” (1986), um mural de Brennand estampado por uma criatura meio cobra, lagarto e planta.


Após a ideia inicial, o projeto foi desenvolvido a partir de novas incursões pelo Rio Capibaribe. Nessas visitas, Neto se aproximou de vários agentes e articuladores ligados ao rio, passou um dia inteiro recolhendo lixo de dentro e de fora d’água no Recife – numa ação coletiva de educação ambiental – e fez ainda uma viagem até a sua nascente, na cidade de Poção, no agreste pernambucano. “A ida à nascente foi um momento especial. Ficamos lá um tempo, mergulhei na água. De repente, eu vi duas árvores muito lindas fazendo uma choupana, uma delas parecia uma jovem mangueira. Aí trouxemos três mudas que estavam debaixo delas”, conta Neto, que teve a ideia de tirar uma lajota do Estádio para fazer uma conexão umbilical com a barriga da terra, plantando as mudas no local.

Tais experiências, somadas às simbologias retratadas na obra de Brennand e motivadoras da própria construção poética de Neto, foram ingredientes fundamentais para a conceituação do projeto que o artista e a curadora Clarissa Diniz denominam de “escultura-rito”. Nessa obra, “tudo é escultura”, “tudo é processo”, aspecto que se materializou nos rituais, da travessia da obra pelo rio até a abertura oficial da exposição.


Além da escultura central, o Estádio é ocupado ainda com outras obras que dialogam com Neto. Uma das paredes laterais do espaço foi pintada pelo o coletivo recifense Iputinga Sociocultural. Em outra parede, a artista Libélula também deixou sua pintura, espaço onde o público poderá ver ainda parte dos despejos retirados pelo artista na ação de limpeza do rio. As pinturas acompanham ainda versos de um cordel para o Rio Capibaribe, escrito por Sula Patrício, da cidade de Vertentes, no interior de Pernambuco.


“Queria convidar os moradores locais para participarem dessa exposição porque, afinal de contas, o Rio é de todos. Eu quis incluir essas vozes que fomos encontrando ali pelo Capibaribe, no sentido de que o Capibaribe é uma espinha dorsal serpenteante que atravessa a cidade inteira. E a cidade acabou voltando as costas para o rio”, conta Neto, referindo-se ao Recife. “Nos últimos anos, a tradição escultórica da qual descende a obra de Ernesto tem se ampliado para abraçar preocupações que, conversando com as suas pesquisas estéticas, acolhem também assuntos diretamente vinculados a questões sociais e ambientais", analisa a curadora Clarissa Diniz.


O rito de Ernesto Neto se iniciou no Marco Zero, ponto inicial e cartão postal do Recife que abriga à sua frente, no molhe do cais do porto, 90 esculturas de Brennand, incluindo a famosa “Torre de Cristal”. De lá, o artista carioca transportou a obra de barco pelo Rio Capibaribe – acompanhado pelo amigo e professor de agogô Rodrigo Scofield – até chegar à Oficina Francisco Brennand, num percurso de 20 quilômetros pela água.


“Este canto, este rezo, dança, esta arte que estamos fazendo pelo Capibaribe representa um rezo por todos os rios que estão sofrendo pela atenção desequilibrada da humanidade sobre o corpo da Terra”, defende Ernesto.

“A inclusão sempre foi um aspecto importante do meu trabalho. Não à toa, a Lygia Clark, Lygia Pape e o Hélio Oiticica trouxeram essa coisa da interatividade na arte. A cultura indígena e a cultura africana são sempre inclusivas. Elas sempre agregam uma roda de samba, vai chegando um tocando agogô, batendo palma, vai juntando todo mundo e os outros estão cantando e está todo mundo dançando. Assim como os indígenas que nos puxam pra dançar com eles. Não é uma separação de palco e plateia, que não é da origem dessa terra aqui que a gente está pisando”, ressalta o artista. “Por isso que chamamos de escultura-rito. No rito, todos nós somos agentes, não tem muita separação entre quem é o artista e o público. Eu acho que é importante sublinhar que estamos diante de uma escultura que é um rito”, completa Clarissa Diniz.




Âncora 1
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